Uma descoberta inesperada pode levar a um novo tipo de
tratamento para a asma. Uma proteína comum do corpo, achada
por acidente nos pulmões de roedores doentes, parece ser a
chave para aliviar os pulmões e brônquios dos 7% da população
mundial que sofrem da doença crônica (segundo dados da OMS).
A equipe do médico pneumologista Jack Elias, da Universidade
Yale, nos EUA, descobriu uma ligação inédita entre uma enzima
(proteína que acelera reações) chamada quitinase e a asma. Ao
bloquearem a ação dessa substância em roedores asmáticos, os
cientistas atenuaram os efeitos da doença. Além da esperança
de novas drogas, essa relação reforça a noção de que a asma
seja, na verdade, um subproduto indesejado de uma reação do
sistema imunológico humano ao ataque de parasitas do ambiente.
Os pesquisadores estudavam camundongos com uma doença
semelhante à asma e descobriram nos pulmões dos roedores uma
substância na forma de pequenos cristais. "Aconteceu
completamente por acaso. Vimos os cristais no pulmão dos
roedores doentes e, de início, achamos que fossem cristais
comuns no catarro. Mas aí alguém no meu laboratório disse: "E
se não for isso?" Aí descobrimos lá uma quitinase", disse à
Folha Elias, 53. "Percebemos que talvez tivesse relação com a
asma. Afinal, ela aparecia tanto nos pulmões inflamados."
As quitinases são enzimas responsáveis por degradar a
quitina, substância presente nas paredes celulares de fungos,
nos exosqueletos (carapaças) de crustáceos e insetos e em
vermes parasitas. Mamíferos não têm enzimas para produzir
quitina -como têm os insetos-, mas possuem várias quitinases
para repelir parasitas que dependem de quitina.
Desconfiados, os cientistas induziram ataques de asma nos
camundongos e examinaram seu tecido pulmonar à busca da
enzima encontrada, no caso a AMCase (abreviação em inglês de
quitinase ácida de mamíferos). Encontraram muito mais AMCase
que nos roedores sadios. Quando a equipe de Elias deu aos
animais um soro que bloqueava a ação da quitinase, a
inflamação nos pulmões dos roedores diminuiu.
"Essa relação é inédita. O desafio agora é achar anticorpos
que bloqueiem esse tipo de quitinase em humanos para produzir
novos medicamentos para a asma", diz Elias, que já verificou
que pulmões humanos com a doença também têm grande quantidade
da enzima antiparasita.
"Na verdade a quitinase, que deveria nos proteger de
parasitas, está desencadeando um efeito secundário nocivo em
nosso sistema imunológico, envolvendo células conhecidas como
linfócitos T auxiliares", diz o cientista.
Segundo o pesquisador, uma das substâncias produzidas por
esses glóbulos brancos, chamada interleucina-13, tem íntima
relação com a presença da AMCase. Quanto mais quitinase, mais
interleucina e mais inflamação.
A conseqüência imediata do estudo, a esperança de um novo
medicamento para a asma --os pesquisadores de Yale já
licenciaram a patente sobre a descoberta para a companhia
americana MedImmune--, não é a única, segundo Elias. Para
ele, o achado pode levar a um rápido método de identificação
de propensão genética a asma em humanos.
"A capacidade genética de alguém produzir quitinase pode
estar ligada à propensão do indivíduo para asma", afirma.
Para Carlos Roberto Ribeiro de Carvalho, especialista da área
e coordenador da Enfermaria de Pneumologia do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, a descoberta é
importante para a compreensão da doença.
"É claro que há muito mais. Não é um gene só e nem uma
proteína só que desencadeiam todo o processo. No entanto, a
descoberta é de grande importância, porque abre um novo campo
de ação para os medicamentos", diz Carvalho. "Não deve ser a
cura da asma, mas é um grande passo para entender melhor a
doença", afirma.
Para Elias, que conhece o Brasil, a descoberta pode ajudar
também os 16 milhões de brasileiros com asma. "Estive em São
Paulo só uma vez, mas tenho parentes na cidade e sei que ela
é muito famosa pela poluição. Talvez a descoberta possa
ajudar os muitos asmáticos que deve haver aí."
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